domingo, 6 de junho de 2010

Prémio Camões

«O preço do feijão

não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão (...)

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço (...)

Do fundo de meu quarto, do fundo
de meu corpo
clandestino
ouço (não vejo) ouço
crescer no osso e no músculo da noite
a noite

a noite ocidental obscenamente acesa
sobre meu país dividido em classes».



Ferreira Gullar, Não Há Vagas e Madrugada

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