«Gosto mais de escrever para as crianças porque elas dão alegria e inspiração» (1)
Acreditamos demasiadas vezes que os que estão mais próximos, os que sentimos mais junto de nós, os que nos ensinaram que nada mais importante que contar histórias, onde a imaginação se liberta para falar com as árvores, com as aves, com as flores, estarão sempre presentes. Afinal ficarão as suas palavras, e mesmo quando são tão estimulantes, parece-nos ser pouco.
Matilde foi, é uma das mais importantes escritoras para a infância que se escreveu em língua portuguesa. Nestas alturas a biografia de um escritor são as suas palavras. Mesmo que perdendo a presença do olhar, do entusiasmo, da transpiração emotiva no encontro que tantas vezes fez em tantas bibliotecas. Ficam os seus títulos, as suas sílabas, onde tentou revelar pelas palavras essa sabedoria de lidar para os dias como uma possibilidade nova, onde o amor se entrega acima dos nossos dias sempre precários de futuro.
«Aurora esperou-me toda a tarde de domingo, na sua cama branca, de ferro.
Tinha posto uma fita vermelha a segurar os cabelos escuros. Esperava-me, esperava a minha visita, cuja promessa as companheiras lhe haviam transmitido.
Veio a família: mãe, pai, irmãos, amigos, as colegas.
– Estou à espera da professora…
No dia seguinte a doença foi mais poderosa que a sua juventude, a sua doçura, a sua esperança.
A cabeça escura, sem a fita vermelha, adormeceu-lhe profundamente na almofada, talvez incómoda, do hospital. Sabemos todos já, amigos, que há vida e morte. Também isso temos de aprender.
Não fiquem tristes por isso. Vejam como as flores nascem quase transparentes da terra, como as podemos olhar à luz do Sol, e morrem, para de novo nascerem. Lembrem-se como de um ovo de um pássaro podem sair asas que voem tão alto em dias de Primavera. E morrem, também, e todas as primaveras nascem de novo. E, sobretudo, lembrem-se do coração de cada um de nós, desta força imensa.
E não adiem os vossos gestos. Procurar alguém que sofra, que precise de nós, nem sequer é um gesto generoso, deve ser um gesto natural que se não adia. Às vezes até precisamos uns dos outros para dizermos que estamos felizes, contentes. Só para isso. Mesmo felizes precisamos dos outros.
Aurora ensinou-me para sempre esta verdade. As lágrimas que por ela chorei já não lhe deram aquela visita dopróximo domingo. Nem a mim a alegria de a encontrar sorrindo, cheia de doçura, com uma fita vermelha a prender os cabelos escuros. Vermelha de sangue, como a vida. O Sol. Flores vermelhas.
Aurora era o seu nome. E a sua vida uma manhã apenas que, na minha distracção ou egoísmo, não tive tempo de olhar. Uma manhã com uma fita vermelha. Que lágrima nenhuma pode reflectir.» (2)
«Aurora esperou-me toda a tarde de domingo, na sua cama branca, de ferro.
Tinha posto uma fita vermelha a segurar os cabelos escuros. Esperava-me, esperava a minha visita, cuja promessa as companheiras lhe haviam transmitido.
Veio a família: mãe, pai, irmãos, amigos, as colegas.
– Estou à espera da professora…
No dia seguinte a doença foi mais poderosa que a sua juventude, a sua doçura, a sua esperança.
A cabeça escura, sem a fita vermelha, adormeceu-lhe profundamente na almofada, talvez incómoda, do hospital. Sabemos todos já, amigos, que há vida e morte. Também isso temos de aprender.
Não fiquem tristes por isso. Vejam como as flores nascem quase transparentes da terra, como as podemos olhar à luz do Sol, e morrem, para de novo nascerem. Lembrem-se como de um ovo de um pássaro podem sair asas que voem tão alto em dias de Primavera. E morrem, também, e todas as primaveras nascem de novo. E, sobretudo, lembrem-se do coração de cada um de nós, desta força imensa.
E não adiem os vossos gestos. Procurar alguém que sofra, que precise de nós, nem sequer é um gesto generoso, deve ser um gesto natural que se não adia. Às vezes até precisamos uns dos outros para dizermos que estamos felizes, contentes. Só para isso. Mesmo felizes precisamos dos outros.
Aurora ensinou-me para sempre esta verdade. As lágrimas que por ela chorei já não lhe deram aquela visita dopróximo domingo. Nem a mim a alegria de a encontrar sorrindo, cheia de doçura, com uma fita vermelha a prender os cabelos escuros. Vermelha de sangue, como a vida. O Sol. Flores vermelhas.
Aurora era o seu nome. E a sua vida uma manhã apenas que, na minha distracção ou egoísmo, não tive tempo de olhar. Uma manhã com uma fita vermelha. Que lágrima nenhuma pode reflectir.» (2)