«Eu sorri cheio de dor, mas dentro daquela dor tinha acabado de descobrir uma coisa importante. (...) Dindinha uma vez dissera que alegria é um «sol brilhante dentro do coração». E que o sol iluminava tudo de felicidade. Se era verdade, o meu sol dentro do peito embelezava tudo...» (1)
Os livros são territórios que nos permitem alcançar com mais facilidade a imaginação e com eles encontramos o modo como em tempos diferentes a infância foi olhada pela sociedade no seu conjunto. Neste sentido a literatura é assim uma fonte para o estudo desse «território desconhecido», nas palavras de Helena Vasconcelos.
O Meu Pé de Laranja Lima é uma incursão pela pobreza, pela incompreensão vivida pelo mundo adulto num determinado tipo de sociedade, mas acima de tudo é uma demonstração de um mundo infantil com as ferramentas do sonho, da ternura, capaz de tornar o real mais suportável. A apreensão de um mundo infantil povoado de sonhos poucas vezes nos trouxe tão emocionados para a nossa dimensão humana.
Este desencontro com a felicidade é um campo onde as sociedades contemporâneas e a literatura coincidem pela dimensão que a própria criança readquiriu em relação a sociedades passadas.
José Mauro de Vasconcelos, que aqui evocamos nos noventa anos do seu nascimento, escreveu um livro que no seu próprio tempo foi um sucesso pela sensibilidade com que apresentou os dilemas da existência de uma criança, que também o era de uma sociedade concreta. De origem humilde, exerceu diferentes profissões em diferentes locais, escritor de grande sensibilidade com uma narrativa simples e original, escreveu entre outros, Banana Brava (1942), Rosinha minha canoa (1962), O Palácio Japonês (1969), O Veleiro de Cristal (1973) e O Meu Pé de Laranja Lima que foi publicado em 1968. Se há livros que nos relembram as tardes em que se iniciava a leitura do mundo, nos sabores da distante infância este é um deles.
(1) José Mauro de Vasconcelos, O Meu Pé de Laranja Lima