sábado, 13 de março de 2010

Um dia infinitamente triste...

«Olha! As palavras inocentes
rejuvenesceram-se afinal
e como noutro tempo as lágrimas brotam
dos meus olhos.
e recordo os dias há muito passados
e a terra natal a alegrar de novo
a minha alma solitária,
e a casa onde cresci um dia com as tuas
bençãos,
onde, alimentado com amor, bem depressa
o menino cresceu.
Ah, quantas vezes pensei que te
reconfortaria
Quando a mim mesmo me via laborar ao
longe no vasto mundo.
Muito intentei e sonhei e fiz-me chagas no
peito
à força de lutar, mas fareis com que as cure (...)
Que asssim, o homem mantenha o que em
criança prometeu.» (1)

(Há dias em que as palavras parecem inúteis, impróprias, insuficientes para nos fazer exprimir qualquer objectividade. Há momentos em que elas parecem incapazes de se redimir de si próprias e nos confirmam esta solidão extrema aonde nos conduzimos. Há dias tão tristes em que as palavras se perderam de qualquer noção de beleza. Este é um desses dias. Na sociedade dos brandos costumes emergem sinais violentos, numa epiderme irreconhecível.

As notícias são de uma tragédia imensa. A indisciplina numa escola é a confirmação da ausência de justiça numa organização social. Sem o exercício do pensamento que molde uma cultura, que lhe dê personalidade, pode um País, uma cidade, uma escola pensar-se e registar-se no real? A verdade parece não ser já uma garantia desta organização humana de tantos séculos. Algo de muito negativo, de muito problemático, ocorre em determinados ambientes educativos.

A escola do conhecimento, a que promove a mobilidade social está cada vez mais longe das aventuras feitas em nome de um progresso desconhecido. A morte de Leandro e do professor de Sintra são o sinal perturbador de uma fragilidade que não se tolera na sociedade dos bytes. A nova sociedade que hierarquiza tudo, avalia todos os comportamentos e os integra em relações de poder não consegue inscrever no seu real uma cultura de respeito.

O silêncio e a indiferença generalizada são o património por este modelo de sociedade, onde a cultura, o acto de pensar, «um presente dos deuses», como o disse o filósofo José Gil é uma extravagância. O encontro com o outro, a amabilidade, a sua demontração pública é hoje algo proibido. A função é hoje mais importante que a pessoa. Limitado na afectividade caminha-se para uma desumanização e degradação das instituições. Não morreu só um aluno e um professor. Assistimos ao ocaso dos valores do carácter numa sociedade em que a generosidade é cada vez mais rara.

(1) Holderlin, citado de Ernesto Sabato, Resistir

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