domingo, 25 de julho de 2010

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Foi um ano diferente. Permitiu o conhecimento de uma realidade nova, a de conhecer de forma mais próxima o universo dos alunos do 1º Ciclo. Foi uma experiência muito interessante pelas conquistas e também pela percepção real de como, entre nós a Lei é muitas vezes uma figura de estilo.

O 1º Ciclo é um mundo diferente e isso nem sempre é compreendido na devida dimensão. Recordo o entusiasmo na voz do «bom-dia professor Luís», das crianças e de como uma Biblioteca lhes desperta  curiosidade e interesse. Aliás as crianças têm uma vocação para lidar com a realidade com mais honestidade que os adultos. As possibilidades são-no mesmo e com elas aprendemos que a expressão visual, o olhar, como expressão do ver tem um significado próprio. A imaginação não é para elas um instrumento ocasional.

No 1º Ciclo percebem-se igualmente as asneiras que uma tecnocracia instalada em Lisboa não compreende. Não compreende que os protocolos assinados com as instituições locais não são aplicadas, por uma evidente falta de processos de regulação. Mas o pior, é pensar-se que uma criança de seis anos pode estar numa escola mais tempo que um operário numa fábrica. E não é pelas horas que os docentes e funcionários lá passam. Os espaços e horas de lazer são limitados. As relações de convívio entre as crianças, o saber estar com o outro é substituído pela maravilha tecnológica, que não solidifica nem o relacionamento, nem na aprendizagem, onde antes de digitar é preciso saber ler, escrever, pensar. 

Quando observo esta iniciativa de fechar de uma só vez perto de setecentas escolas, a juntar à concentração de mais de dois mil anos num só agrupamento mais se percebe o profundo erro que se baseia em critérios apenas de gestão, não de formulação de uma ideia educativa. Fazer deslocar crianças de seis anos, significa colocá-las um dia inteiro fora de casa, do contacto com os pais. Alguns acharão aqui uma generosidade pedagógica, mas é um instrumento de desvinculação a uma comunidade e mais uma forma de retirar instrumentos a regiões abandonadas. É a confirmação tecnocrática de que do jardim de infância ao fim do secundário, os processos burocráticos são no fundo idênticos, como se houvesse capacidade, tempo e oportunidade de os reflectir numa multidão de pessoas que dificilmente têm possibilidades de se conhecer.

Aos que nos bombardeiam todos os dias com os requintes  prometidos do futuro, onde é nas grandes aglomerações de alunos, em super escolas que os alunos, todos os alunos irão aprender, era bom que conhecessem e analisassem os modelos escolares da Dinamarca, da Finlândia, ou dos mais recentes estudos no Estados Unidos. 

É lamentável que uma época da vida de uma pessoa tão especial, como a infância seja tão pouco cuidada nas oportunidades de desenvolvimento que cada uma tem e que oferecem genuinamente. Foi essa a minha experiência de uma Biblioteca de uma Escola de 1º Ciclo. Os alunos chegam ali com um real interesse pela escola, pelos professores, pela descoberta, com olhos ainda abertos ao espanto e à imaginação. Todos sabemos que passados alguns anos, o quadro muda muito. Seria bom pensar se não é o sistema educativo, e a maneira centralizadora como é estruturado, de Bragança a Faro, uma das grandes causas dessa situação? 

Imagem, in Penelope Dullagham, Bublegum

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